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TJMS. Senado autoriza aplicação de pena alternativa para ‘mulas’.

2 de março de 2012

Na edição do dia 16 de fevereiro de 2012 do Diário Oficial da União (DOU) está publicada a Resolução nº 5 do Senado Federal que suspendeu a vedação da conversão em penas restritivas de direitos para os pequenos traficantes drogas, os “mulas”, prevista no parágrafo 4º do art. 33 da Lei nº 11.343. A medida teve como base a decisão do Supremo Tribunal Federal nos autos do Habeas Corpus nº 97.256/RS que declarou inconstitucional a vedação da aplicação de penas alternativas para os pequenos traficantes.
Antes mesmo de entrar em vigor a Resolução do Senado, o desembargador do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, Romero Osme Dias, é um dos magistrados pioneiros no país em aplicar penas restritivas de direitos para um perfil de réus primários, com bons antecedentes, que não pertencem a nenhuma organização criminosa, possuem residência fixa etc., e que são presos e condenados por tráfico por transportarem pequenas quantias de drogas. Uma visão antes isolada do Desembargador sul-mato-grossense e criticada por muitos agora é ratificada nacionalmente por meio da norma editada pelo Senado Federal.
Os mulas, como são popularmente conhecidos, são condenados a penas tão severas quanto as aplicadas aos traficantes profissionais de drogas. Eles representam o grande contingente da população carcerária em MS. No caso dos presídios femininos, a maior parte das detentas que cumprem pena são as chamadas mulas.
A visão do Des. Romero ganhou repercussão em outras regiões do país durante a 1ª reunião do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF) realizada em março de 2010, em Brasília, quando o magistrado representou o TJMS no encontro.
Vale ressaltar que o desembargador não defende a impunidade do grupo, mas, para ele, permitir que réus primários sejam mandados para um caótico sistema prisional é uma atitude de alimentar uma massa carcerária que após permanecer anos em regime fechado retorna à sociedade em uma condição muito mais difícil de reinserção social.
Segundo defende, a recuperação de uma conduta social dentro da lei é muito mais provável de se tornar real para este perfil de infrator se ele for submetido a um cumprimento de penas alternativas (como prestação de serviços à comunidade). O intuito é fazer com que aprendam a lição e, para isso, as penas alternativas têm se mostrado muito mais eficazes do que os presídios, aponta ele.
Em entrevista sobre a edição da Resolução do Senado o Des. Romero comentou: “Primeiramente, devo dizer que recordo com alegria a sessão referida, em Brasília, quando fazia parte do Sistema de Monitoramento dos Presídios, do Conselho Nacional de Justiça, e expus a ideia contida no voto correspondente. Após ignorar insistentes pedidos dos presentes, para que eu interrompesse minha exposição em razão da chegada do Ministro Gilmar Mendes, ao final, ouvi de Sua Excelência que eu tinha razão. Foi o segundo passo que demonstrou que estava percorrendo o bom caminho, pois o primeiro foi a minha consciência. Posteriormente, enfrentar a mídia e a intolerância da opinião pública (por incrível que pareça, até de advogados) foi o último passo. Hoje, a Resolução do Senado e o acórdão do STF reafirmam que o caminho era aquele, árduo, mas frutífero”.
Acompanhe abaixo os questionamentos feitos ao Desembargador do TJMS:
1- O que muda com a edição da Resolução nº 5 do Senado nas decisões dos juízes e desembargadores do país? Eles terão que se adequar a visão que o senhor já vinha aplicando em Mato Grosso do Sul?
Suponho que sim, se pretendem tratar os condenados naquelas situações (primário, portador de bons antecedentes, com emprego lícito, pequena quantidade, etc) com a dignidade de seres humanos que eles não perderam por terem infringindo uma norma respectiva. A subtração de um direito de um miserável por uma autoridade é a pior forma de transgressão. Se a ninguém é dado o direito de alegar ignorância da lei para escusar-se de uma obrigação ou de safar-se de uma acusação, imagine este dogma imposto aos magistrados, que são muito bem pagos para representar o Estado, no respeito às leis e a Constituição. Aliás, este é o magnânimo teor de seu juramento quando assumem suas funções. Logo…
2- O senhor acredita que com a declaração de inconstitucionalidade do STF e a Resolução do Senado a opinião pública tende a mudar sua ótica de que aplicar pena alternativa ao “mula” é sinônimo de impunidade?
Gostaria de acreditar que sim, mas tenho dúvidas. As pessoas são imediatistas, não pensam por si e “raciocinam” com base nas informações e opiniões da imprensa. Quanto pior o raciocínio mais encontra adesões, o que explica este messianismo midiático que autoriza qualquer um a transformar-se em jurista. Antes éramos o país dos árbitros de futebol, hoje, dos doutores em direito penal. Melhor seria chamá-los de rábulas, chicaneiros. Atirar uma pessoa nas condições estabelecidas pelo acórdão do Supremo a um cárcere, não é só antijurídico, é desumano e cruel. A prisão, só para casos em que a segregação compulsória for necessária, pois ela é a maior prova da falência da humanidade em fazer do Direito Penal a cura para tratar daqueles que cometeram um ilícito. Ilicitude maior é atirá-los nos braços das quadrilhas que comandam os presídios, o que é sabido de todos, mas “tolerado” pela hipocrisia e maldade inerentes aos que “acreditam que é um doutor, padre ou policial que está contribuindo com a sua parte para o nosso belo quadro social”, como bem dito pelo jusfilósofo Raul Seixas (Ouro de Tolo). Ou ainda, pelo jurisconsulto mor, Chico Buarque de Holanda, no Hino de Duran, quando sentenciou: “se trazes no bolso a contravenção. Muambas, baganas e nem um tostão. A lei te vigia bandido infeliz, com seus olhos de raio X”.

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